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Considerações sobre "Os Corruptos" de Fritz Lang e sobre a admiração de Godard pelo cineasta

Jean-Luc Godard nutria uma grande admiração pelo diretor austríaco Fritz Lang. Godard tinha uma colaboração e uma interlocução aberta com ele, sendo que frequentemente citava cenas de seus filmes em suas próprias obras. Em "O Desprezo" (Le Mépris), de 1963, Godard convidou o próprio diretor para participar do filme em um papel de ator, interpretando a si mesmo como diretor de cinema que dirige uma nova adaptação de "A Odisséia" de Homero. Assim, a presença de Lang como ator em "O Desprezo" é uma das muitas formas com as quais Godard homenageia o cineasta e também é uma forma de refletir sobre o próprio cinema, através da metalinguagem.

"The Big Heat" é um filme noir americano de 1953 dirigido por Fritz Lang e estrelado por Glenn Ford, Gloria Grahame e Lee Marvin. O filme é considerado um clássico do gênero noir e é conhecido por sua representação crítica e sombria da violência, da corrupção e do crime organizado. A trama gira em torno do sargento Dave Bannion (interpretado por Glenn Ford), que investiga o suposto suicídio de um colega policial e acaba se deparando com uma rede complexa de corrupção envolvendo policiais, políticos e criminosos locais. No decorrer da trama, sua própria esposa é assassinada e ele acaba enfrentando ameaças violentas de seus inimigos, sendo obrigado a abandonar seu cargo. Ao final, os autores e cúmplices dos crimes vão sendo revelados e ele acaba sendo reconduzido ao seu cargo na polícia.

O jogo de luz e sombra presente na obra é um elemento fundamental do estilo visual do filme noir, influência direta do expressionismo alemão, fase esta da história do cinema da qual Lang fez parte. O filme é conhecido por sua utilização hábil da iluminação para criar dramaticidade, como por exemplo, o clima sombrio e opressivo que reflete a natureza corrupta e violenta da trama. O jogo de luz e sombra também é usado para criar um senso de mistério e suspense. Em algumas cenas, os personagens são iluminados apenas parcialmente, criando uma sensação de ambiguidade, em um jogo constante de desvelamento e ocultação, capaz de revelar a personalidade, os impasses e conflitos morais que os personagens enfrentam a cada situação vivenciada.


Godard escreveu que "Todos os roteiros de Lang são construídos da mesma forma: o acaso obriga um homem a sair de sua concha individualista e tornar-se um herói trágico na medida em que 'a força da mão' do destino foi abruptamente imposta sobre ele"(1956). Mais do que apenas uma referência na história do cinema, o cinema de Lang se coloca como uma influência importante na obra de Godard. Outro momento de interlocução entre ambos pode ser visto na entrevista que Lang concede a Godard, onde dialogam sobre suas diferenças criativas e semelhanças. O Dinossauro e o Bebê, subtítulo desta entrevista que está disponível em vídeo, é uma referência ao próprio Lang e ao Godard respectivamente, enfatizando a distância geracional que separa os dois, mas que por outro lado não impede o diálogo e a troca de ideias entre eles.

 

Este texto foi escrito por Celina Lage, professora do Programa de Pós-Graduação em Artes da UEMG - Universidade do Estado de Minas Gerais, em complementação à sessão comentada de "Os Corruptos" (The Big Heat, Fritz Lang, EUA, 1953), na faixa de programação História Permanente do Cinema, no dia 04/05/2023, como parte da mostra "Adeus à Godard".

 

Sobre a autora

Celina Figueiredo Lage é Professora do Programa de Pós-Graduação em Artes (PPGArtes/UEMG) e dos Cursos de Graduação da Escola Guignard da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG). Sua trajetória acadêmica e artística fez com que se tornasse expert nas relações interartes, com ênfase nas Artes da Antiguidade Grega e da Contemporaneidade. Atuou de 2009 a 2012 no Programa de Pós-Graduação em Artes Aplicadas da Universidade Helênica Aberta, na Grécia. Doutora em Literatura Comparada, Mestre em Teoria da Literatura e Licenciada em Letras, com habilitação em Grego e Latim. Pós-doutorado na National & Kapodistrian University of Athens (Grécia) e na Athens School of Fine Arts (Grécia). Ex-Bolsista da Fundação Alexander Onassis, do State Scholarships Foundation (Grécia), da FAPEMIG e do CNPq. Ex-Membro do Conselho Municipal de Política Cultural de Belo Horizonte - COMUC. Vice-Presidente do Comitê Brasileiro para Reunificação das Esculturas do Partenon (membro do International Commitee for Reunification of the Parthenon Sculptures) colaborando regularmente com Museu da Acrópole e Ministério da Cultura da Grécia. Ganhadora do prêmio Pontos de Memória no Exterior do Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM) e do Ministério da Cultura, do prêmio Coroa de Ouro pela Associação do Helenismo Ecumênico (Grécia), e do Prêmio Xerox do Brasil na categoria Tradução pelo livro "Poesia Grega Antiga". Bolsista de produtividade da UEMG. Possui atuação internacional no campo da performance, música experimental, poesia sonora, poesia digital, video-arte, fotografia e curadoria de eventos multimídia. Áreas de atuação - Artes Visuais, Arte Digital, Novas Mídias, Curadoria, Cinema, Fotografia, Arte Contemporânea, Estudos Interartes e Artes da Antiguidade. Literaturas Clássicas, Literatura Comparada, Teatro e Performance.



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